domingo, maio 18, 2008

Café, cigarro e introspecção

Eu estava sentado, na frente do computador, fazendo algumas coisas. Ontem, foi dia de tomar bomba, e tudo funcionava de uma maneira estranha. Para quem não sabe, bomba é uma mistura louca de cerveja escura,clara, coca-cola e conhaque. Uma bomba explodindo em sua cabeça, quase que literalmente falando.

Tive a habitual vontade de tomar café depois do almoço. Botei água para esquentar, duas colheres de café e duas de açúcar, numa dessas xícaras em que você sempre usa para tomar café. As vezes, quando você não acha a tal xícara, chega a ficar irritado. Costumes estranhos que temos, mas não quero falar sobre isso.

Para mim, é um ritual bastante frequente. Café, cigarro e introspecção.

Tomei um gole do café quente, e automaticamente acendi um cigarro. Comecei a pensar. Logo, avistei o Arthur, vindo de longe com aquela cara de quem estava junto tomando bomba. Usava uma botina preta, e uma camisa polo listrada. Pensei em falar " hey, estou na minha instrospecção!", mas ele não entenderia e eu falei a segunda coisa que veio na minha mente:

-E essa camiseta de playboy?

-Playboy? Não sei, as vezes uso pra trabalhar.

Nos cumprimentamos e falamos qualquer coisa. Combinamos de dar uma volta por aí. Troquei de roupa, peguei 3 garrafas de água, e seguimos adiante. Por sorte, o Renan ligou a tempo, e pegou a carona e a terceira garrafa de água.

Dentro do carro, eu estava pensativo. A humanidade, transformou o mundo numa coisa complexa, a ponto de não fazer mais sentido. Fazemos coisas que não precisamos, lemos coisas que não queremos, somos quem não queremos ser. Eu percebia a simplicidade de certas coisas, dentro daquele carro.

A estrada, cheia de curvas, tinha um visual maravilhoso. Dezenas de Plátanos acompanhavam o nosso caminho.As folhas do plátano no outono são lindas. Avermelhadas, frágeis e simples. Tudo aquilo sempre esteve ali, e eu apenas não tinha percebido. Fechei os olhos, e parecia escutar as folhas caindo.

Visitamos a galeria de um cara, chamado Flávio Scholles. Ele tinha centenas de quadros, espalhados por uma casa antiga. Era simples, e falava com orgulho de cada quadro. Tinha uma camiseta branca, com manchas de tinta, e um cavanhaque interessante. Parecia um clichê saído de um filme qualquer. Nos falou sobre os nomes,as histórias, os significados. Pendurado na parede, estava o quadro que ele orgulhosamente denominava "o quadro que fala".

-Essa é a forma de linguagem universal. A língua escrita e falada se restringe cada vez mais. Os vários idiomas,sotaques e gírias, vão limitando nossa comunicação. Se um outro povo, de outro mundo, viesse parar aqui,é assim que teríamos que falar com eles...

Ficamos os 3, olhando para aquele quadro. Foi uma bela definição. Admirei por duradouros segundos, aquele quadro que falava. Era uma moça, loira, sentada de uma maneira estranha, com uma cuia de chimarrão. "olá quadro que fala" "olá rapaz louco que fala com quadros"...

Seguimos adiante, numa estrada que tinha um estilo familiarmente europeu. Olhei para os vales, as casas e as pessoas. Reparei num casal de velhos, sentados na varanda de casa. Tomando um chimarrão, eles tinham um olhar profundo e melancólico. Lembravam do tempo em que as pessoas acreditavam em coisas reais. Sentados naquela varanda. Parecia que sempre estiveram ali, e permaneceriam até o fim da humanidade.

Chegamos numa represa. Descendo alguns barrancos e umas escadas, nos encontramos num paredão estreito, e à nossa frente, surgiu uma impressionante queda d'água. Um vale imenso completava o fundo. Era extremamente alto, e eu gravei aquela imagem única dentro de minha cabeça. Nenhuma foto poderia refletir isso. Os amigos e a sensação que aquele lugar me trouxe. Em silêncio, escutávamos a natureza. O cair da água, o vento. A fumaça do meu cigarro se dispersou, e minha mente a acompanhou. Espalhando-se pelo ar, flutuando.

Fomos embora, e fiquei quieto o restante do caminho. Tomamos uma cerveja em Gramado e continuamos. Cheguei em casa. "oi mãe, oi pai". Tomei um banho, comi nuggets com bisnagas, e fui fazer um café. Tomei um gole do café quente e automaticamente acendi um cigarro. Fechei os olhos, e me vi andando numa estrada, cheia de plátanos. Com suas flores avermelhadas de outono, tão frágeis e simples, como a vida deveria ser.



By escritor da zona

PS: se quiserem conhecer o cara do quadro que fala,é só ir até Santa Maria do Herval, ou visitem o site www.fscholles.com.br

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

geralmente é nesses momentos intimistas que a gente percebe a beleza contida na simplicidade do mundo. V.

2/18/2009 12:24 AM  

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