sexta-feira, junho 06, 2008

Conto Romântico Urbano

Ele era diferente dos outros. Vestia trapos, em vez de roupas. Fumava palheiro, em vez de cigarros. Escutava música, não barulho. Curtia a vida como qualquer um gostaria de curtir.
À noite, trabalhava no SuperMercado 24h. Durante o dia, escrevia poemas eróticos depois de tomar um copo de leite.

Assim, ele não tinha amigos. Apenas uma tartaruga e um hamster. E aquilo estava de bom tamanho. Comia, quando precisava comer. Cagava umas 3 vezes por dia. Até que um dia, sua mãe ligou e mudou sua vida.

-lauro, tá na hora de te arranjar uma mulher.

-mãe, são 3 da manhã.e eu estou de folga

-eu sei. não consigo dormir pensando na possibilidade de não ter netos.

- aí sou eu que não posso dormir com suas preocupações?

PAUSA DE UNS 37 SEGUNDOS

-lauro. amanhã, a filha da nossa vizinha daqui, vai procurar emprego em porto alegre, e eu disse que ela poderia ficar no seu apartamento. ela continua bonita! lembra dela?

-Caralho mãe, tu tá louca? Nem conheço mais essa mulher. E se ela virou uma louca varrida?

-Aí formarão um belo par.

Desligou na cara de Lauro. Ela não estava brincando. Provavelmente, a filha da vizinha estava no ônibus, dormindo ao lado de um passageiro fedorento, vindo para Porto Alegre. Lauro vestiu-se, e saiu de casa. Gostava de caminhar pela madrugada. Precisava pensar. A filha da vizinha era a sua antiga musa; a Cleópatra de Júlio César; a Yoko Ono de John Lennon. Seu nome era Glória.

Parou numa daquelas tendas de frutas que ficam abertas a noite inteira, comprou 3 maçãs por R$1,00, e saiu. O cara da tenda era conhecido de Lauro, e lhe atirou uma bergamota de brinde. Foi embora rindo e mastigando um generoso e suculento pedaço de maçã.

Há muito tempo, pegou o primeiro poema erótico que escreveu, e deu para Glória. A doce menina, tinha 11 anos na época, e ficou horrorisada. Lauro passou um tempo numa clínica psiquiátrica, e voltou 5 anos mais tarde. Agora, ele tinha seus 18 anos. Ela, na flor de sua adolescência, veio até ele no dia em que ele voltou. Ele estava na janela, curtindo sua liberdade. Ela debruçou-se ali, com um vestido curto, e falou bem baixinho no ouvido de Lauro:

-oi. desculpa por tudo. eu era jovem demais. hoje, fico toda molhada só de lembrar daquele teu poema.

E Lauro não fez nada. Apenas a observou, rebolando no jardim. No mesmo dia, foi pego por sua mãe enquanto fumava crack. Foi internado numa clínica de dependentes químicos, e perdeu Glória depois daquele dia.

Escreveu poemas memoráveis na clínica. Estava mais uma vez aprisionado, por um bando de loucos que não sabiam de nada. Aquilo tudo lhe deu força. Melhorou o comportamento. Fingiu ser uma pessoa normal. Parou de escrever, cortou os cabelos e fez o bigode. Perdeu a vontade de usar drogas. Foi liberado.

Passaram-se 3 anos. E ele modou-se para Porto alegre, depois de passar todo esse tempo na Jamaica, fumando maconha. Um daqueles programas, de reintegração de loucos e viciados na sociedade, arranjou-lhe o emprego no SuperMercado. E esse, era basicamente o resumo da pacata e tranquila vida de Lauro.Pelo menos era o que eu precisava escrever para contar minha história.

Agora, no silêncio da madrugada, ele lembrava desses velhos tempos. A cidade estava deserta, e nem os mendigos estavam dormindo nas ruas esta noite.

Estava parado na frente dum trailer, onde tinham caras que vendiam cachorro quente. Tinha alguma festa por ali, e aquilo estava atrolhado de gente. Chegou sua vez:

-hey. me vê um cachorro quente. sem salsichas.

-sem salsichas?

-é. com os molhos, o milho e a ervilha. toda a parafernália, menos as salsichas.

-será o mesmo preço!

-sem problemas...

Deu uma mordida na segunda maçã, depois de devorar o cachorro quente sem salsichas. Ficou ali sentado, fumando seu palheiro e bebendo um suco de pêra.

Foi passear no Guaíba, e o sol estava nascendo. Uma mancha vermelha no céu, surgia do horizonte. Alguns jovens tomavam chimarrão . Os atletas começavam a correr ou caminhar por ali. Enxergou também, um casal de meia idade, dividindo um cigarro e lendo versos de Neruda:

"tu eras também uma pequena folha
que tremia no meu peito.
o vento da vida pôs-te ali.
a princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo."

Nada como uma bela caminhada pela cidade. Limpava sua mente, ocultava os problemas. Voltou tranquilamente para seu apartamento. Andava com uma calma invejável. As pessoas, indo para o trabalho, esbarravam-se umas nas outras como formigas atarefadas. E ele ria de tudo. As pessoas nem sabem mais, porque elas fazem tudo isso. Porque trabalham.Porque têm Tv gigante. Porque se limpam com papel higiênico macio e perfumado.

Ia passando pelo seu prédio, quando o porteiro lhe chamou:

-senhor lauro? tem uma moça que subiu para seu apartamento. deixei ela entrar porque a mãe do senhor havia ligado. mas ela não tem a chave do apartamento. e sei lá onde foi parar.

Lauro subiu pelas escadas. Encontrou Glória. Tão linda, meiga e perfeita como sempre foi. Ela estava dormindo na frente do apartamento de Lauro, bem no corredor. Uma das malas era utilizada como travesseiro. Estava tapada com um casaco de lã. Roncava baixinho. Era o primeiro ronco agradável que ele tinha escutado na vida. Tinha um toque feminino. Uma sutileza.

-glória? levanta daí. vamos entrar.

Ela mal respondeu. Ele carregou-a até a cama. Puxou um cobertor, e ela sorriu quando sentiu-se aquecida. Continou ouvindo o ronco suave de Glória, enquanto escrevia um poema erótico. Dormiu.

Os dois acordaram mais ou menos ao mesmo tempo. Tiveram o mesmo pensamento. Perceberam que podiam acordar para o resto da vida, um do lado do outro. Glória deu um beijo longo em Lauro. Finalmente.

Fizeram amor o resto do dia. Hoje, ele não iria trabalhar nem escrever poemas eróticos.Mas estava feliz com sua vida. E lá fora, na louca Porto Alegre, uma chuva fina caía.

2 Comments:

Blogger nikieseuboné. said...

boh


não sei otra coisa a escreve a nao ser um sonoro e curto

BOH

6/06/2008 11:21 PM  
Anonymous Anônimo said...

faço minhas as palavras do cara ali de cima. BÓ. fodástico. bó. V.

2/17/2009 11:50 PM  

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