domingo, setembro 14, 2008

No carro do Arthur

Somos livres, ou pelo menos, é o que a maioria acredita. Ironicamente, ao mesmo tempo, crescemos aprendendo que sem dinheiro não somos nada. Crescemos aprendendo que temos que ser alguém na vida.Temos que fazer algo grandioso, "escrever um livro e plantar uma árvore". Mas sinceramente, isso não faz muito sentido. Acabamos esquecendo das pequenas coisas, dos pequenos gestos, e das lições que a vida nos dá, a cada dia que vivemos. E ficamos presos a isso, a essas obrigações.



Não acho que há uma maneira de fugir disso. Querendo ou não, a sociedade está assim como está, devido a um longo processo histórico, e tentar remar contra a maré de uma maneira extremista, é suicídio.



Contentamento? Não. Não acho que o mundo esteja perto de ser um bom lugar para se viver. Mas aos poucos, devemos ir tentando. Não somos totalmente livres, e creio que nunca seremos livres de verdade. Mas devemos tentar, entendem? Da maneira que nos é possível.



Lembro que era algo assim, que eu estava pensando, naquela manhã. 10 de julho de 2008. O Arthur dirigia o carro, e estava de aniversário. Mas era cedo, e não estaríamos aqui para comemorar com ele. Na verdade, ele estava dando uma carona. A última carona, antes de tudo começar. Mas era a carona certa. Pois o Arthur deveria estar indo com nós naquela viagem, e já que ele não iria, pelo menos deveria ser o último a se despedir de nós. Conversávamos. Eu estava um pouco nervoso, e acho que o Matias também.



Descemos do carro, e fumamos um cigarro. O Arthur, o cara que sabe ser objetivo e prático, olhou para mim e para o Matias, e disse:



-Aí gurizada. Se cuidem por lá. Aproveitem, e mantenham contato.



Demos um aperto de mão, e agradecemos. Era uma pena que ele não iria junto. Ele, eu e o Matias, combinávamos isso há tempos. Mas ele conseguiu um ótimo emprego, e não podia rejeitar.


Acho que fazia mais de um ano que combinamos essa viagem. Ela inclusive já devia ter saído há algum tempo (como vocês podem ler nesses dois textos 1 e 2), e finalmente havia chegado a hora. Mas algumas coisas haviam mudado, desde a primeira vez em que pensei sobre os motivos da viagem. No começo, eu só queria sair daqui, largar meu emprego, ficar longe de tudo. Lembro até duma conversa que tive, com uma pessoa que sempre deu bons conselhos.

"hey andré, só tem uma coisa: nada é geográfico!"

E é verdade. Não importa aonde você for, com quanto dinheiro, com quantas novas possibilidades, os seus problemas estarão com você. Os defeitos que eu vejo aqui, podem não existir em outros lugares, mas outros surgem. Pessoas ruins existem em todo mundo. Decepções e frustrações também. Não há como fugir de você mesmo. E por sorte, eu finalmente tinha consciência disso, naquele momento no carro do Arthur. Não era mais a viagem de fuga e esquecimento. Não era a viagem da redenção, como eu esperava antes. Era apenas uma viagem. Para ver coisas novas, conhecer pessoas e lugares diferentes, para pensar sobre os problemas, e não fugir deles. E talvez a oportunidade de sentir-se um pouco mais livre.


Estava na beira da estrada, ao lado do Matias, com uma mochila de 10 kilos nas costas. Via o carro do Arthur se distanciando. Ele é um grande amigo. E naquela hora, já sabíamos quanta falta ele faria. Agora era só esperar. Já tínhamos uma longa carona. O cara se chamava Rodrigo, era primo do Arthur, e iria até Goiânia levar uma carga em seu caminhão. Nós queríamos chegar no Peru, e tínhamos um longo caminho pela frente.



Avistamos um caminhão, que ligou o pisca, e entrou no acostamento.



"É ele!", os dois pensaram, automaticamente. Pegamos as mochilas, e corremos. Entramos, e nos apresentamos. Me surpreendi com a juventude do Rodrigo. Ele parecia ser um cara legal. Foi tudo muito rápido. Mas de repente, caiu a ficha. Acho que foi a primeira vez que senti um frio na barriga como esse. Não saber o que vai acontecer no dia seguinte, não saber se você vai conseguir chegar onde você quer. Agora era real. Seguimos pelo Rio Grande do Sul afora. Finalmente havia começado. Sentado, naquele caminhão, eu estava feliz. Talvez um pouco nervoso, mas a sensação de liberdade era imensa. Pensei em todos os amigos, na Juliana, nos meus pais, e deixei o que me prendia para trás. De agora em diante, era apenas o Matias e eu.


Continua...

o escritor da zona

2 Comments:

Blogger nikieseuboné. said...

aaaah maluuucoo!! agora sim!! virei leitor assiduo desse blog!!nao que antes nao era, mas parece que agora a monotoniedade, sei la se isso existe, vai ficar pra trás...


abraçp

9/16/2008 11:31 PM  
Anonymous Anônimo said...

bem, amigos, agora o ibope vai aumentar vertiginosamente!
continu-a! continu-a!

a lôca.

9/17/2008 2:03 PM  

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