sexta-feira, fevereiro 08, 2008

A la Bukowski

Acordou,e foi direto para o banheiro. Arriou a tampa do vaso, mijou e depois vomitou naturalmente. Lavou a boca com um copo de água, e pegou uma garrafa de vodka, que estava pela metade, jogada no lixo.

Por um tempo, ficou olhando para uma tela rabiscada, com a garrafa numa mão e um pincel na outra. Encheu a boca com vodka, e cuspiu na pintura, que lhe causava desgosto. Aos poucos, a tinta foi cedendo e a imagem começara a ficar borrada, indicando que a tinta ainda estava fresca.

Desde que Danton Viegas começou a pintar aquela tela, havia perdido a noção do tempo. Não sabia quanto tempo dormia, e não fazia idéia de que hora do dia estava. Não sabia nem há quantos dias estava assim. Deslizou o pincel suavemente sobre àquela imagem, que começava parecer agradável aos seus olhos. Entornou a garrafa de vodka, e deitou-se mais uma vez.

Ainda estava acordado, quando ouviu alguém bater a sua porta. Detestava ser interrompido nesses momentos, mas a pessoa do outro lado, parecia insistente. Levantou mal-humorado, e abriu a porta. O homem que havia lhe incomodado, olhou para o rosto de Danton, e observou o estado do apartamento. Janelas fechadas, garrafas de bebida e cigarros por todo o canto. Aquele lugar cheirava a melancolia e solidão.

-Vêde, porque dizem que a humanidade está perdida! Até os grandes artistas, possuidores de capacidades sublimes, acham que o talento só é encontrado com solidão e auto-destruição.

Danton Viegas, olhou irritado para àquele homem, e sussurou:

-Entre, Profeta.

Danton nunca dava muita bola para o Profeta. Ele era um escritor indignado com o mundo, e vivia dizendo como as pessoas deveriam agir. O problema, é que provavelmente pensaram nele, quando inventaram a expressão: "faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço". Danton, considerava-o um hipócrita, mas lhe convidou para entrar quando viu, que este trazia uma sacola com algumas cervejas.

O Profeta, largou a sacola em cima de uma estante bagunçada, e disse que a cerveja ainda estava quente. Danton Viegas pareceu ignorar as palavras daquele homem, abriu uma lata e tomou como se fosse água.

-Diabos, Viegas! olhe para essa sua cara !

-Ela não deve estar pior que a tua, Profeta.

O Profeta consentiu, pegou também uma cerveja quente, e começou a tomar. Era preciso, as vezes, reforçar a realidade para que aquele velho escritor, caísse na real. Já faziam anos, em que ele havia se transformado no que ele mesmo criticava: um homem de inteligência e talento, porém perdido em sua complexidade interior.

Tomaram as 10 latas que estavam na sacola, em completo silêncio. O Profeta, pareceu admirar a tela estendida, durante todo esse tempo. Quando Danton Viegas, jogou a última lata pela janela, o escritor quebrou o silêncio:

-Esta é sua grande obra? Estão falando por aí, que tu vens trabalhando em algo grandioso. Que estás há dias trancafiado neste apartamento, chorando de solidão, derramando suas lágrimas diante deste quadro que eu passo a admirar.

-Admiras mesmo, Profeta? O que enxergas nele?

-Enxergo a complexidade do homem. A tristeza, a raiva e a incompreensão. Todos esses sentimentos, entre traços e cores diferentes. Enxergo o desespero pela morte, e ao mesmo tempo a fome de viver.Mas eu estou bêbado. Talvez seja apenas isso.

O Profeta deu uma risada gostosa, e levantou-se, já embriagado. Deu um abraço em Viegas, que retribuiu com uma emoção comovente. Uma lágrima escorreu pelo rosto do escritor, que falou tristemente:

-Adeus, meu filho. Faças, o que acha justo e correto. Encontre a verdade na realidade, e não na confusão de seus pensamentos.

Dizendo isso, o Profeta saiu pela porta. Danton Viegas ficou ali, parado. Caiu na cama, e adormeceu por muitas horas. Dormiu,como se fosse o último sono. Sonhou,como se fosse o último sonho.

Acordou,e foi direto para o banheiro. A tampa já estava arriada,e ele apenas precisava vomitar. Abriu uma garrafa de vodka, e com ela tirou o gosto ruim da boca. Parou diante de sua pintura mais uma vez. Desta vez, ao invés do pincel, sua outra mão carregava um revólver. Nesses momentos, o tempo corre de outra forma, e não sei dizer se foram dias,horas, ou minutos que ele ficou olhando para o quadro. Colocou uma bala no revólver e apontou para a tela. Depois, apontou para sua própria cabeça.

Exitou por um instante. Via, naquela pintura, um rosto desfigurado e desesperado. Os olhos, mesmos disformes, exclamavam por vida. Tinham esperança e sonhos, apesar de demonstrar solidão. Aos poucos, a arma pareceu ficar pesada, e o braço de Danton Viegas foi cedendo. Seus dedos, deixaram que o revólver escapasse pelas mãos, e este caiu no chão. Mais uma vez, não sei dizer se foram dias, horas ou minutos que ele ficou ali, parado olhando para o quadro. Mas desta vez, estava sorrindo.

Correu para a janela e abriu-a. Pensavam que ele estava louco, quando começou a gritar

-Eu quero viver! Eu quero viver! LIBERDADE! LIBERDADE!

Na última noite, ele realmente havia dormido seu último sono, e sonhado seu último sonho. Foram as últimas horas de sono de um escravo. Um escravo da própria tristeza e solidão. Viegas, saiu pelas ruas, cantando canções felizes, e distribuindo flores para as moças bonitas que passavam. Sobrou uma flor ainda, para deixar no caixão do Profeta hipócrita.A verdade, agora estava na realidade, e na confusão de seus pensamentos...

by Escritor da Zona

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

CARALHO MEU!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

2/08/2008 11:38 PM  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

4/16/2008 11:31 PM  

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